A Liliam escolheu o caminho que muitos jovens designers brasileiros sonham em trilhar – o INTERNACIONAL. Tomou coragem, confiou no seu talento e resolveu botar os pés em terras extrangeiras em busca de sonhos profissionais e oportunidades criativas. Formada em moda na Santa Marcelina em São Paulo, com passagem no Japão para estágio, logo depois voltou para o Brasil mas por aqui não ficou.
Hoje a Liliam mora há seis anos no Brooklyn – NY e criou uma grife própria de jóias – a LILLOT – na qual trabalha full time. Assumidamente multi-tarefa, ela mesma desenha, produz peças, fotogarafa, constrói seu site e divulga sem perder o entusiasmo. Um exemplo de designer independente que mantém o controle total de seus produtos e dos canais de distribuição.
Esta foi a conversa que tive com a Liliam:
A: A sua formação é em moda masculina, como foi a sua decisão de trabalhar com jóias ?
L: É engracado, pois eu nunca imaginei que fosse trabalhar com jóias. Bom, eu cresci em contato com pedras e gemas porque meu pai é atacadista e eu sempre ia ajudá-lo na loja. Mas quando iniciei o curso de moda em São Paulo, minha vontade era trabalhar como fashion stylist e depois como Diretora de Moda. Eu até participei como assistente de desfiles no São Paulo Fashion Week (na época ainda Morumbi Fashion Week) e recebi convites para trabalhar com grandes grifes brasileiras mas logo após a graduação ganhei uma bolsa para fazer um estágio de moda por um ano no Japão. Nem pensei duas vezes e fui. Quando voltei ao Brasil, a recessão estava brava e nada na indústria da moda me atraia – não via mais futuro pra mim no Brasil. Decidi me mudar para os EUA aonde eventualmente eu iria lançar minha marca de moda masculina ou trabalhar como fashion stylist. Afinal de contas, Nova Iorque é a capital da moda. Assim, ingênuamente, peguei minhas trouxas e com 400 dólares no bolso embarquei na minha jornada. Tive que ir, paralelamente, vencendo outros desafios: aprender a língua, trabalhar como garçonete para sobreviver sem deixar o sonho morrer. E foi neste percurso que a transição para acessórios aconteceu. Eu fazia testes com fotógrafos e agências para montar meu portfólio como fashion stylist e criava acessórios para os looks que fotográfavamos. Um dia fiz um broche com uma pistola e correntes douradas de presente para um amigo e foi aí que tudo começou.
A: Lembro que você tinha jóias feitas com partes de relógios recicladas. Recentemente anda fazendo peças mais orgânicas, mas não menos conceituais. De onde você tira idéias para seus trabalhos ?
L: Minha inspiração esté em tudo que vejo ao redor – pessoas na rua, filmes, música, arte, conversas, política, história…. Eu gosto de combinar texturas e fazer justaposições de elementos high e low end. Criei a coleção com os displays de relógio porque achei que seria interessante fazer broches que parecessem com máquinas antigas, refinadas como um relógio de bolso, mas com uma atitude lo-fi. Então hoje em dia eu trabalho com duas linhas de jóias, como dois segmentos paralelos. Eu decidi separar a produção em duas linhas porque a Lillot comecou a tomar uma forma mais elaborada desde que comecei a aprender mais sobre técnicas tradicionais de joalheria. A característica desta linha é conceitual, uma combinação elaborada entre materiais preciosos e alternativos, o primitivo e futurístico. E para não deixar de oferecer minhas peças espontâneas e para o dia-a-dia, criei uma outra linha chamada Lo-fi, apostando num estilo mais casual.
A: Você mora no Brooklyn, em Park Slope, mas também já morou em Williamsburg, que é um foco mundial de novos designers. Conte um pouco sobre a atmosfera criativa desta região. Dá mais energia para criar estando no meio de outros artistas ?
L: A energia é definitivamente diferente. Park Slope é mais “família”. Famosos como as atrizes Jennifer Connelly e Maggie Gylenhall moram aqui além de muitos escritores, cartunistas, produtores, donos de loja e designer. Tem muita energia criativa mas é diferente de Williamsburg. Lá todo mundo é mais novo e descolado, a maioria trabalha com moda, é roqueiro ou artista. Eu morei em Williamsburg, a nova “meca criativa”, por dois anos, mas acredito que o hype está passando. Com muitos yuppies mudando para a área, o aluguel tem subido absurdamente e a construção de lofts de luxo tem atraído tipos wall street e afastado os artistas. O legal de viver em Williamsburg é poder colocar roupas para lavar numa Laundromat, atravessava a rua para dar uma checada na galeria de arte, pegar um bagel e depois voltar para colocar as roupas na máquina de secar. Domingo de manhã então é o dia perfeito para tomar um brunch nas redondezas e depois andar pela vizinhança olhando lojas, galerias de arte, livrarias indie, observar pessoas e fotografar street art. Sem contar que, no final de semana, todo mundo monta sua mesa na calçada para vender coisas usadas! Eu ocasionalmente utilizo um estúdio de joalheria equipado em Williamsburg e observo como a grande parte das pessoas que descem na estação de metrô Bedford Avenue é jovem e tem um certo “look”. A plataforma do metrô parece um fashion show!
A: Você produz suas jóias no seu estúdio que divide com o seu marido que também trabalha em casa, como ilustrador. Como é a rotina de trabalho de um casal que mora e trabalha juntos?
L: Meu marido tinha começado a vida de free-lancer quando eu me mudei para o seu estúdio/apartamento em Park Slope, no Brooklyn. Quando eu tinha um outro emprego, saía para trabalhar de manhã e quando voltava para casa a noite, lá estava ele em frente ao computador, sem ter saido uma só vez! Hoje, eu entendo bem que trabalhando em casa às vezes você simplesmente “esquece” de sair e tomar um ar. Nosso apartamento é pequeno e cada um montou a sua mesa em extremos diferentes da casa. No decorrer do dia, cada um se concentra nas suas criações – eu tenho as duas linhas de acessórios e tenho feito tudo, desde a criação, producão gráfica, produção de fotos e distribuição. O meu marido, Dan Goldman , também é multi-tarefa – escreve, desenha e ilustra HQs, faz ilustrações para revistas, promove, publica tudo via Internet. Fazemos intervalos para almoço e aí aproveitamos para trocar idéias sobre o que fazemos e o que iremos fazer, tiramos sarro do nosso gato, alimentamos o nosso flickr, tomamos chá com leite de soja o dia todo, e como todo mundo que trabalha em casa, não paramos nunca! Quando há deadlines, o dia começa as 4 ou 5 da manhã e não tem hora para terminar. Muitas vezes viramos a noite e haja cafeína para manter o ritmo.
Nossos amigos que sempre perguntam se queremos matar um ao outro vivendo e trabalhando juntos no mesmo espaço. Acho que o segredo é o respeito mútuo. Quando queremos privacidade, colocamos nossos fones de ouvido ! E se um está arracando os cabelos por causa de deadlines, ou constipação criativa, um abraco ou uma surpresa boba resolve. Ter senso de humor é muito importante.
A: A sede do Etsy fica no Brooklyn. A proposta deles é tão legal quanto parece ? Você já participou de alguma das oficinas que eles oferecem ?
L: O site da Etsy é como se fosse um Ebay só que para objetos handmade. E o legal é que não é só para designers e crafters dos EUA mas está aberto para gente do mundo todo.
A Etsy foi a primeira a vender a linha LILLOT -coloquei à venda gargantilhas, colares, broches, brincos, todos feitos com objetos de metal obsoletos. Hoje, vendo a LILLOT através do meu próprio website (construido por mim, aprendendo wordpress, photoshop e illustrator na marra!) e num outro site para designers independentes chamado Stars and Infinite Darkness. Na Etsy eu ainda mantenho peças da minha segunda linha, a Lo-fi.
Eu acho que o sucesso do Etsy é ser uma grande união de crafters e designers, uma comunidade. Afinal de contas todo artista independente que vive em Nova Iorque sabe como é trabalhar e morar no mesmo cubículo-apartamento. Unir todo mundo num local onde você possa trocar idéas, espaço, equipamento, material com pessoas como voce é uma idéia genial. Eu ainda não tive a oportunidade de explorar o espaço pessoalmente porque meu trabalho envolve o manuseio de metais e o equipamento tende a ser mais complicado em termos de manutenção emissão de tóxicos. Já outras modalidades como o crochê, costura, feltragem, papel e bijuteria não têm este problema.
A: Porque você concentra as suas vendas pela Internet ? Pensa em usar mais algum canal de vendas ?
L: No momento, eu vendo pela Internet e em bazares que eu mesma organizo. Há muitas butiques bacanas por aqui, mas estou sendo cautelosa na seleção porque o local onde você coloca seus produtos para venda é muito importante para a sua imagem. Outro impedimento é que algumas butiques somente trabalham em consignação e outras até “pegam” suas idéias emprestadas para fazer produtos por conta própria. É comum acontecer isso com designers independentes, que não têm como se proteger e acabam tendo suas pecas reproduzidas sem permissão. Gosto muito das lojas online porque você não precisa acumular um grande estoque e expõe seu produto mundialmente.
Lillot – loja online
Lillot na Stars and Infinite Darkness
Parabéns por mais essa entrevista incrível!
Não conhecia o trabalho dela, é lindo!!
beijão!