As feiras baseadas em trocas estão voltando a pipocar pelas cidades. Já tinha ouvido falar das trocas de brinquedos, livros, vinis e roupas. Mas nesta semana participei de uma muito especial e com tema que muito me interessou. Achei que vocês iam gostar de saber mais sobre esta experiência, principalmente porque ela se chamava 1º Escambo de materiais para Artesanato. O encontro nasceu como um evento de Facebook e rapidinho viralizou. De repente, quase 2000 pessoas confirmaram presença na feira que rolaria no Parque da Água Branca. Pelo jeito, mais pessoas em SP têm a síndrome de comprar materiais e não usar – ou como dizia o convite, pessoas que sofrem do mal chamado “quero todas as cores de lã dessa loja” :-)
Para quem nunca participou de um evento assim, o funcionamento é simples. Faça uma rapa nas suas coisas que estão paradas faz tempo sem uso – o momento é de desapego. No local, coloque um pano ou uma toalha no chão e exponha o que trouxe. Os outros convidados farão o mesmo.
Para facilitar, você pode escrever em um papel na forma de itens o que trouxe e o que tem interesse de receber em troca. O evento começa e as pessoas circulam pelo local. Quando “der um match” entre tenho e quero, a troca pode começar!
Flagra de um momento de troca: um bastidor de madeira por alguns metros de fita em ponto ajour.
E aí, vale ou não vale? Quem diz isso não somos nós que estamos do lado de fora… As trocas acontecem quando existe um acordo comum entre as partes. Se as duas pessoas ficam contentes, a troca acontece! Não é legal insistir e nem forçar a situação. Com educação e bom senso, a coisa flui!
Confesso que quando cheguei no parque, estava um pouco tensa. Será que tinha trazido as coisas certas? Era pouco ou muito? Alguém se interessaria? A experiência seria legal ou me estressaria?
Decidi ser mais low profile. Guardei o que trouxe na mochila dentro de um saco tipo zip transparente e circulei pelos participantes. Caminhei devagar, olhando o que cada um tinha trazido, o que escreviam no papel. Depois de ver tudo, voltei para o começo onde tinha visto algo que me interessava. E fiz minha primeira abordagem. Não sabia muito bem como começar, então eu simplesmente disse: “Gostei disso aqui. Tem alguma das minhas coisas que interessa a você?”. Mostrei meus materiais. A menina mexeu, analisou, pensou, escolheu uns carretéis e perguntou “posso trocar por isso?” . Eu topei e a primeira troca aconteceu!
Fiquei super feliz em conseguir algo que queria e seria útil por outra coisa que estava parada em casa, sem uso – mas que para a outra pessoa fazia todo sentido e completava a lista de materiais de um projeto por fazer! Que demais…
Me empolguei com essa equação. Conseguir algo que me interessava sem precisar pagar já é sensacional. Mas também curti muito ver a mesma emoção rolando na outra pessoa, do outro lado. As trocas não eram silenciosas, pelo contrário. Rolavam histórias de onde aqueles materiais tinham sido comprados, como foram usados, porque sobraram. A troca virava uma conversa. O valor numérico do bem perdia o sentido e surgia um envolvimento. Em nenhum momento senti uma pressão de desigualdade. No fundo, os dois lados ficavam satisfeitos em ver que suas coisas ganhariam utilidade e continuidade.
Um restinho de novelo de lã amarelo vai virar cabelo de boneca. Uma linha de crochê marrom que nunca usei vai ser usada por alguém experiente na técnica. As sobras de miçangas que pouco usei foram para uma menina que vendia colares e pulseiras. Outra ganhou uns potinhos de plástico vazios para guardar suas coisinhas. E assim o tempo foi passando…
Trocas triangulares também rolaram – essas são uma modalidade mais avançada haha! Foi assim: gostei dos novelos que uma moça tinha, mas ela não se interessou por nada do que eu trouxe. Minha amiga, que estava ao lado, ofereceu umas sianinhas. Ela curtiu e topou concretizar a troca. Então depois, eu ofereci algo do meu pacote para ela, que escolheu etiquetas de roupas. Troca feita, as três felizes!
Ou seja, o que vale é se ajudar. Tinham pessoas até doando materiais. Porque a ideia era fazer a energia circular. Não queriam voltar para casa com algo que já decidiram que não seria mais usado.
Outra coisa muito legal que acaba acontecendo naturalmente são trocas de experiências. Uma dica de como usar isso aqui, outra de como fazer aquilo ali. As conversas vão rolando, trocam-se contatos, Whatsapp, trocas já ficam combinadas para a próxima feira. Eu mesa já separei uns pedaços de bambu para uma garota, uns papeis de scrapbook para outra, e assim vai surgindo uma empolgação já para o próximo evento.
A vibe estava ótima! Todo mundo entendeu o funcionamento e fez altas trocas, tudo na paz e sem brigas. Para a próxima vez, vou me inspirar nestas duas coisas que vi:
- colocar minhas coisas em uma caixa. Desse jeito, ganho mobilidade – posso expor no chão ou passear mostrando o que tenho. E os materiais das trocas que concretizaram, guardar na mochila ou em uma sacola separada para não confundir.
- levar algo para comer que possa ser compartilhado. Estas participantes, por exemplo, estavam oferecendo pedaços de bolo e sanduichinhos. Entre uma mordida e outra, engatamos uma conversa e descobrimos vários interesses em comum!
- separar os materiais na véspera (não na última hora!). Vou também deixar uma caixa para ir juntando as coisas ao longo do mês para o próximo evento.
A Natália Nogueira, uma das organizadoras, fez um ótimo trabalho antes, durante e depois do evento. Se você pensa em organizar algo parecido no seu bairro ou sua cidade, vale a pena se inspirar nas recomendações:
- pense bem no tema – precisa ficar claro no título e descrição do evento. Neste caso, foram apenas materiais usados para fazer artesanato e manualidades, por exemplo tecidos, botões, lãs, linhas, revistas, papéis, miçangas, etc.
- evento de troca não pode envolver dinheiro. As pessoas não devem levar produtos para venda!
- sugira aos participantes levar papel e caneta para anotar os produtos que tem para trocar e os que tem interesse em receber. Uma etiqueta ou crachá de identificação é bom. Cartões de visitas para quem usa/tem também.
- sacolas para juntar lixo e deixar o local limpo também não dá para esquecer!
- sobras do evento,caso as pessoas não queiram levar de volta para casa, podem ser encaminhadas para doação de alguma instituição de caridade.
No final, saldo mais do que positivo para mim! Não tirei foto dos itens que levei, mas estes são os que consegui arrematar e levar para casa. Dá para ver que eu garimpei materiais bem saudosistas, como as tintas de tecido Abaeté (quem lembra desse fecho de metal?), as fitas de cetim (parecem para sapatilha de balé!), os fios de rayon (acho que nem existem mais…) e a tabuada do Ronald (brinde quase pré-histórico do Mc Lanche Feliz). Tudo o que adoro!
Os organizadores pretendem repetir o evento uma vez por mês. O próximo já tem data marcada e acontecerá no dia 20 de fevereiro, no MIS – Museu da Imagem e do Som.
Para saber mais, acompanhe pela página do evento e do grupo:
Os comentários estão abertos para mais dicas sobre participação em feiras de trocas. E também para histórias de quem participou neste primeiro escambo handcraft.
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